Ouvi muito, anos atrás e com prazer, a Carla Ferro[i] falar sobre não-escolarização[ii] e desescolarização[iii].
E confesso que, apesar de me achar razoavelmente esperta, demorei para entender que a não-escolarização é para crianças e que a desescolarização é para adultos.
É irônico que alguém como eu, que tem experiências de aprendizagem em todos lugares que vai e em todas situações que está, tenha demorado tanto a perceber que, para que a aprendizagem se faça livre em mim e se desfaça de vez dos muros e prisões em que foi colocada, eu teria que me desescolarizar. E que por mais que eu seja uma praticante ativa disso (com consciência do que estou fazendo, desde 2012) , este é um processo que ainda estou realizando.
É complicado.
Não é necessariamente o local.
Não é o “onde” a escola é ou está, seria um contra-senso eu aderir a ideia de que o problema seria “o local”, se cada vez mais o local, o ecossistema, o design deste ecossistema foram e são temas de conversas para comunidades de negócios, locais de coworking, comunidades de prática, comunidades de aprendizagem, e outros.
Não são necessariamente as pessoas.
Neste sentido, também as conversas sobre formação e manutenção de comunidades de trabalho, em hacker spaces, em fablabs (apesar que estas pararam um pouco depois de 2017), comunidades de prática, comunidades de aprendizagem e outros , são frequentes.
Não é necessariamente o conteúdo.
Se eu percebo que aprendo de uma maneira mais tradicional, ok.
Mas o que é “de uma maneira mais tradicional” para mim já entra no escopo de coisas que tenho que ter cuidado.
Por que no que eu observo, o mais complicado disto tudo é o controle e a adequação a algo, é o “eu sou quem ensina, você é quem aprende” ditado e imposto de maneira rígida e autoritária.
E a rígida hierarquia imposta para aqueles que “são os que ensinam”.
Estas rígidas estruturas de poder que permeiam todos estes processos matam o prazer de aprender, o prazer da convivência, o prazer da evolução.
E o pior de tudo: o fato de agirem como se o “eu sou uma garrafinha vazia que deve ser preenchida com um saber não escolhido por mim nem para mim” fosse uma verdade.
Alguns problemas decorrentes deste tipo de raciocínio:
Eu não sou “uma garrafinha” e minha mente não funciona como uma.
Eu não sou igual a você e nem você é igual a mim, e enquanto eu acho este fato fascinante, o “sistema escola que é o mesmo desde o medievo” acha isso uma desgraça, principalmente no ensino básico.
Se eu uso o sistema de “garrafinha” para aprender e apreender conteúdos fora de qualquer trilha imposta ou local “oficial” e/ou quero fazer ligações não óbvias entre saberes, eu tenho problemas. As coisas rapidamente começam a não fazer sentido (para os “do poder”).
E se continuo este processo, começo a sentir necessidade de “desaprender” hábitos, métodos, traumas, etc,etc,etc que não só não fazem o menor sentido, como me atrapalham.
E fazer isso sozinho até pode ser produtivo, mas fazer este processo em comunidades de aprendizagem é MUITO mais produtivo.
Principalmente porque aprender (e apreender) de maneira que o conteúdo faça sentido para mim é algo que envolve emoções, envolve significados e significações, envolve os sentidos. E quando envolve trocas, isso tudo se processa em uma velocidade muito maior do que quando se faz sozinho. E os insights e “eurekas” acontecem com frequência muito maior.
Então por que não fazer isso em comunidades de aprendizagem e com facilitadores e mentores ?
E se focam nas pessoas, no seu auto-conhecimento, na construção de seu protagonismo, na formação da comunidade e, em consequencia de tudo isso, em “novas lentes de se olhar a realidade”[vi], a coisa é mais exponencial ainda.
Esta colocação das “novas lentes” é interessante.
Porque isso significa que mesmo que você continue atuando no mesmo lugar que atuava antes, você não vê mais o mesmo. Então posso atuar em mudanças de realidade mesmo estando no mesmo lugar.
E tudo isso envolve muita inovação social e muita experimentação.
Grata pela leitura.
Mas interessante mesmo seria você experimentar o processo-experimentar, mesmo que seja em coisas bem pequenas.
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[i] https://www.facebook.com/carlacferro
[ii] Crianças que não vão a escola para aprender
[iii] Adultos que precisam aprender que as crianças não precisam ir à escola para aprender, mas que para isso precisam “tirar a escola de dentro de si”.
[iv] [retirado]
[v] [retirado]
[vi] Modelos de mundo?
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Obs: Modificado do artigo originalmente publicado em outubro de 2016.
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