Pensando em produtos, processos e redes, falo de um pdf[1] (que não está mais disponível) da Lala Deheinzelin[2] , e ressalto uma parte dele:
“4) De produtos a processos : o tangível se concretiza em produtos e o intangível em processos, que são mais difíceis, pois exigem visão sistêmica, ação integrada e continuidade (além disso são menos visíveis e portanto parecem menos atraentes para os financiadores…)”
Isso supõe, inclusive, que ao se falar no intangível dos processos, em contraposição aos tangível dos produtos, algo de um novo olhar sobre multiversos ( e não mais um universo só), possa ser apreendido.
Por que sem isso a relevância se perde, o sentido se vai, e nada do que abaixo falaremos sobre coisas, situações, relações, etc que sejam intangíveis poderão ser percebidos em toda sua relevância.
Por mais contra intuitivo que seja, as pessoas muitas vezes estão em universos diferentes.
Em um dado ambiente (pretensamente) construído para se ter inovação (seja ele físico ou virtual) e que seja voltado (pensado) para o desenvolvimento de relações em rede, o enfoque em produtos (por exemplo, eventos e cia) e não em processos (as relações em rede) irá fazer com que este ambiente paradoxalmente fique cada vez mais inviável, inclusive financeiramente, mesmo que se aumente em muito o número de eventos (por exemplo) que se faça neste ambiente.
Inclusive porque as pessoas que estarão frequentando este espaço tem diferentes visões de mundo, diferentes conceitos de muita coisa que emergirá daí, diferentes necessidades, desejos e possibilidades.
Ou seja, estarão em universos diferentes e o espaço comportará um multiverso.
Ou mesmo que continue viável, o esforço a se fazer para se manter a rede relevante e ativa vai ser imenso.
E convenhamos que mesmo um “animador de redes” ou um “gerente de comunidade” tem seus limites, por mais eficiente que ele seja.
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Todos que participam deste tipo de rede/comunidade/grupo, de forma presencial ou a distância, de forma analógica ou digital, de forma pontual ou continuada, precisam entender que o que mantêm um ambiente deste tipo (seja ele físico e/ou virtual) para o desenvolvimento de relações em rede, é a contribuição de muitos, não os eventos de alguns.
E aqui não estou desmerecendo de maneira alguma os eventos, mas um ambiente para o desenvolvimento de relações em rede não tem a mesma lógica [econômica] de um ambiente de eventos. E nem seus fluxos o tem.
Ou seus não-fluxos, que no final é o que mais é de difícil percepção e compreensão.
Um evento pontual tradicional, em que um ou poucos falam, e muitos escutam, apesar de muitos pagarem (este tipo de evento, com “autoridades”, faz sucesso), não acrescenta quase nada à manutenção de um espaço com estas configurações (que foram ditas acima) a médio e longo prazo.
Por que este tipo de espaço vive (e se mantêm) de níveis altos de interação, de participação continuada ativa e efetiva de muitas pessoas, não de participações passivas intensas e pontuais (por mais tentadores e geradores de buzz que estes eventos únicos sejam).
Isso vale para espaços de aprendizagens de convivência em rede, para espaços makers, para espaços hackers, para espaços colaborativos, e outros.
Se muitos não entenderem a lógica disso, dificilmente poucos manterão a rede.
Usando abaixo as lógicas “invertidas” (ou não) de um financiador “anjo” (de cima para baixo) e de um financiamento “crowd” (de baixo para cima) para falar sobre algumas coisas:
Financiador “anjo”
R$70.000,00 X 1
R$7.000,00 X 10
R$700,00 X 100
R$70,00 X 1000
R$7,00 X 1.000
Crowd
Em um se precisa de 1 para obter R$70.000,00; no outro, 1000 que dêem R$7,00 , se obtêm R$70.000,00.
E daí?
E daí que arranjar um financiador “anjo” é relativamente muito mais simples que manter uma rede de colaboração e interação ativa.
Explicar para um e mostrar o porquê das vantagens de ser um investidor não implica em ter que movimentar uma comunidade/rede e tudo que decorre disso (modo de ver o mundo, entender o que é interação, entender minimamente o que é governança de uma comunidade, respeito às diferenças, etc,etc,etc).
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Saberemos que esta lógica estará sendo cada vez mais efetiva quando cada vez mais espaços forem sendo mantidos por muitos ou melhor dizendo, espaços de interação de vários tamanhos e tipos forem sendo criados e mantidos em rede.
Mesmo que a maioria seja efêmera, isso faz parte da dinâmica, o importante é que outros continuem emergindo.
Finalizo dizendo que espero que o conceito de commons, de P2P (peers to peers), pessoas fazendo por pessoas esteja cada vez mais sendo entendido.
E exercido.
Por que, no final das contas, o que faz o commons se manter em determinado ambiente é o intangível, mesmo que ao sê-lo, faça emergir produtos tangíveis.
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[1] http://laladeheinzelin.com.br/wp-content/uploads/2010/07/2008-Economia-Criativa-e-Desenvolvimento-oportunidades-e-desafios.pdf (não está mais disponível)
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